Em Moçambique, as águas das inundações provocadas pelo ciclone Idai baixam de forma gradual. À medida que o nível da água diminui, porém, uma nova devastação é revelada.
Centenas de milhares de pessoas perderam suas casas. Muitas delas, como João Filipe Mawane, de 28 anos, também perderam familiares. A mãe de João morreu na enchente. Agora ele quer apenas poder visitar seu túmulo, mas não pode. A água continua sendo uma barreira, e João não sabe ao certo onde sua mãe foi sepultada.
“Não há como atravessar para o lugar onde minha mãe está enterrada”, diz ele. “Até agora, não sei exatamente onde está o túmulo da minha mãe – se é aqui ou lá.”
As comunidades em Moçambique se esforçam para enterrar seus mortos com dignidade e respeito. Mas a destruição do ciclone separou muitas famílias. Algumas ainda não sabem se os entes queridos realmente morreram. Outras não sabem como encontrar a sepultura para prestar seu respeito.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) apoia as comunidades afetadas pelas enchentes a recuperar os corpos, identificá-los e enterrá-los em covas claramente demarcadas.
“Realizamos toda a gama de atividades relativas à gestão de cadáveres”, explica o especialista forense do CICV Stephen Fonseca. “Tivemos a oportunidade de encontrar restos mortais e recuperá-los com as autoridades e a comunidade.”
“Também visitamos as sepulturas para ter uma ideia de como são escavadas e se serão reconhecidas nos próximos anos”, prossegue Fonseca. “Assim, podemos oferecer orientações técnicas, equipamentos e coisas básicas como pás e enxadas, e até [ajudamos a] cavar buracos. Porque isso é muito difícil aqui, e muitas comunidades perderam tudo.”
A tarefa é árdua para todos os envolvidos. Mas é a única maneira de conseguir que as famílias em busca dos entes queridos possam começar a dar um desfecho ao luto. Ainda assim, pode ser difícil encontrar todos os que desapareceram.
“Infelizmente, nem todos esses casos podem ser recuperados”, afirma Stephen Fonseca. “Tivemos vários desafios e não fomos bem-sucedidos em todos, mas certamente podemos fazer um esforço para garantir que haja uma gestão digna dos mortos, de modo que as famílias e comunidades possam de fato enterrar seus entes queridos.”
Ninguém sabe quantas pessoas perderam a vida no ciclone Idai. O número exato talvez nunca seja conhecido. Mas o trabalho agora, além do apoio para a reconstrução das comunidades, deve ser assegurar que o maior número de mortos seja encontrado e identificado, e que as famílias sejam informadas para que jovens como o João possam realizar o luto e recordar da maneira que necessitam.
“Minha mãe morreu exatamente ali, e eu nem vi onde minha mãe foi enterrada”, diz ele. “Não há maneira de chegar ao lugar onde a sepultaram. Não tenho mais nada. Não tenho um plano. Existe alguma empresa que tenha um barco para vir até aqui? É a segunda vez que venho a Madala.
Mais informações:
Tendayi Sengwe, CICV Moçambique, tel: +258 850 368 582 / +27 66 476 4446
Crystal Ashley Wells, CICV Nairóbi, tel: +258 85 049 7255 / +254 716 897 265
Fatos importantes
• Especialistas forenses trabalham nas comunidades remotas com as autoridades de Moçambique para realizar a gestão digna dos mortos. Isso inclui a documentação dos cadáveres e a criação de covas demarcadas, na esperança de que as famílias possam começar a dar um desfecho ao luto. O CICV também doou sacos mortuários às autoridades de Moçambique e Zimbábue.
• Equipes do CICV trabalham com as Sociedades da Cruz Vermelha em Moçambique, Zimbábue e Malaui para instalar sistemas que ajudem a reunir os familiares separados. Isso inclui o registro dos detalhes dos desaparecidos e ligações gratuitas para que as pessoas entrem em contato com os entes queridos para informar que estão vivas.
• O site Restabelecimento de Laços Familiares continua a receber casos de pessoas que reportam estar vivas ou que registram a busca de um familiar. Até 29 de março, cerca de 260 pessoas foram registradas como desaparecidas. Esperamos que o número de casos registrados aumente nas próximas semanas, à medida que nossa equipe prosseguir com o registro manual das pessoas sem acesso a internet ou rede de celular.